O processo de quebra das proteínas ocorre graças à ação de enzimas. As enzimas são também proteínas, mas especializadas no trabalho de quebra de outras moléculas, incluindo as proteínas.
Quando um peixe é capturado e morre, e os seus sistemas param de funcionar adequadamente, a ação das enzimas é revertida gradualmente apenas para a decomposição.
Após a morte, o peixe, como todos os outros animais, passa por uma série processos de decadência cujo primeiro passo é a autólise: a degeneração das células e órgãos através de substâncias químicas, processos desencadeados por enzimas intra-celulares. As enzimas intracelulares, que existem dentro das células que compõem o tecido, quebram lentamente as proteínas do tecido muscular em aminoácidos, incluindo o glutamato, e é dessa forma que o sabor se desenvolve.
A velocidade do processo autolítico aumenta com o aumento da temperatura ambiente, mas podem ser interrompidos se as texturas forem rapidamente congeladas ou desidratadas.
Em consequência da degeneração autolítica dos órgãos do trato gastrointestinal, a flora bacteriana do trato intestinal espalha-se pelo resto do cadáver, iniciando um processo chamado putrefação, a segunda fase da decomposição.
A atividade bacteriana produz inicialmente gases como dióxido de enxofre, dióxido de carbono, amónia, metano etc. e continua com a destruição das proteínas musculares e a produção de aminas tóxicas, como a cadaverina e putrescina.
A verdadeira salga, aquela usada para produzir peixe salgado e carne, produz uma desidratação dos tecidos que bloqueia a autólise, mas precisa de uma grande quantidade de cloreto de sódio (NaCl), processo que podemos comparar à produção de presunto. Neste caso, trata-se de carne da perna de porco, que é salgada para não se estragar, ou seja, não entrar em putrefação, e assim, ao longo dos meses, as enzimas vão decompondo as proteínas dos músculos.
Mesmo em ambientes com menos salinidade como a salmoura, – ainda que com alto teor de sal 10-20% de NaCl – não é impedido o avanço dos processos autolíticos, mas é o suficiente para impedir o início da putrefação parando o desenvolvimento de microrganismos perigosos para a saúde.
Passado algum tempo, o resultado da decomposição em salmoura leva à formação de um líquido perfeitamente comestível, muitas vezes de cor âmbar, salgado e cheio de proteínas, iodo e flúor, histidina e vitaminas A e D (lat. garum, liquamen). Também se obtem uma substância pastosa muito salgada (lat. allec) com excelente valor nutricional.
A outra parte invisível do processo de realização do Garum é a contribuição de micróbios, bactérias em particular. O microbioma humano é a soma de todos os microrganismos que residem nos tecidos e fluidos humanos e em cada local anatómico, a nossa boca, pele, sistema digestivo, possui o seu microbioma específico.
Os peixes têm também milhões de bactérias principalmente nas vísceras, muito mais do que os humanos na pele, porque a sua superfície é húmida. Existem assim milhões de enzimas por grama de peixe, especialmente no sistema digestivo e portanto muitas coisas vivas no tecido dos peixes mortos, enzimas que quebram proteínas e gorduras, para obter energia, alimentarem-se e reproduzirem-se.
No processo desse metabolismo, os micróbios geram os seus próprios conjuntos característicos de moléculas voláteis que são determinantes para o aroma do Garum. As enzimas dos músculos e as enzimas das vísceras – se o sistema digestivo for incluído na preparação do Garum – contribuem muito para a sua qualidade e sabor. São pois os micróbios que geram grande parte do aroma.
Pelo facto de os micróbios estarem envolvidos neste processo, é crucial que na produção sejam seguidos certos cuidados por forma a evitar a presença de micróbios patogênicos e que podem provocar doenças, como o botulismo. O botulismo pode resultar do crescimento de bactérias do género Clostridium, sendo controlado pelo uso do sal, pois estes micróbios não suportam altos níveis de salinidade.
A produção de Garum é um sistema muito complexo, pelo que, diferentes tipos de molhos de peixe, feitos com diferentes processos, diferentes tipos de peixe, diferentes formas de produção, podem resultar em sabores também muito diferentes.